Primeiros deslocados pelas mudanças climáticas no Panamá se despedem de sua ilha
Uma comunidade de indígenas do Panamá recebeu nesta quarta-feira (29) do governo as casas onde eles vão viver no continente após abandonarem, entre a saudade e a esperança, sua pequena ilha, que corre o risco de ser devorada pelo mar devido às mudanças climáticas.
"Estou emocionada. As casas estão bonitas, são pequenas, mas muito confortáveis", declarou à AFP Vidalma Yánez, de 57 anos, em frente àquele que será seu novo lar.
Em cerimônia formal, o presidente Laurentino Cortizo inaugurou o bairro Nuevo Cartí, construído na área indígena de Guna Yala, no Caribe panamenho, para realocar cerca de 1.200 habitantes da ilha Cartí Sugdupu, ameaçada pelo aumento do nível do mar.
"A crise climática que o mundo enfrenta nos obrigou aqui no Panamá a mudar da ilha para esta urbanização de cerca de 300 casas", disse Cortizo, ao entregar as chaves à primeira das famílias beneficiadas.
Entre 3 e 6 de junho, os moradores vão começar a se mudar da ilha, que fica a cerca de 15 minutos de distância de lancha. Eles são os primeiros deslocados pelas mudanças climáticas no Panamá, segundo o governo.
Os indígenas viviam amontoados e sem serviços básicos em Cartí Sugdupu, que tem o tamanho de cinco campos de futebol. Ela é uma das 365 ilhas do arquipélago da região de Guna Yala, várias das quais correm risco de serem inundadas. Quarenta e nove delas, que são habitadas, estão apenas entre 50 centímetros e 1 metro acima do nível do mar.
"Há outras ilhas panamenhas que também estão em situação de vulnerabilidade", alertou Cortizo, após responsabilizar os países desenvolvidos pelo aquecimento global. O presidente entregou pessoalmente uma centena de chaves, mas, concluído o ato, todas já estão nas mãos dos novos proprietários, ressaltou o governo.
- Mudança de vida -
Nuevo Cartí foi construído com um investimento estatal de 12,2 milhões de dólares (62,7 milhões de reais na cotação atual), em uma área de 14 hectares pertencente a esta comunidade.
"A forma de viver vai mudar muito, as pessoas da ilha estão acostumadas a uma vida diferente", diz Yánez, mãe de três filhos, animada para deixar a superlotação da ilha. "É melhor do que estar lá. Lá na minha casa estamos todos juntos [amontoados]", diz ela, que vai morar com os filhos e dois irmãos em uma casa de dois quartos.
Os habitantes de Cartí Sugdupu, que vivem da pesca, do turismo e da produção de mandioca e banana que colhem na área continental, não possuíam acesso à água potável, compartilhavam os sanitários e a maioria também não possuía eletricidade contínua.
Em Nuevo Cartí, eles terão casas próprias com dois quartos, sala de estar, sala de jantar, cozinha, banheiro e lavanderia, além de acesso a água e luz. Cada casa também possui uma área de 300 m² para plantio.
"Será um pouco difícil, porque não teremos o mar tão próximo para pescar, mas vão entrar diferentes negócios", diz Yánez. Além disso, há casas equipadas para pessoas com deficiência e instalações relacionadas à cultura da etnia Guna.
Franklyn, que vai viver com a mulher e cinco filhos, diz que ganha a vida indo para o continente trabalhar nas plantações de banana. Agora, não vai depender de uma canoa para se deslocar.
"Lá é puro mar", diz ele, nostálgico. "Aqui é pura floresta, onde as crianças podem correr e fazer mais coisas", acrescenta, otimista.
S.Ramos--LGdM