Jovens da Guiné Equatorial idealizam o 'sonho americano'
A Guiné Equatorial, um pequeno país de 1,6 milhão de habitantes, foi poupada há muito tempo do êxodo de jovens que atingiu outros países africanos. Mas tudo mudou desde que o país entrou em crise, há uma década.
“Estou indo para os Estados Unidos, para fazer qualquer trabalho. Não é difícil encontrar trabalho” lá, diz Paciencia Mangue, de 32 anos, que, como tantos outros jovens, sonha em partir em busca de uma vida melhor.
“O que você não consegue encontrar em seu próprio país, você encontra em outro lugar”, acrescenta Laura Ntogono. Aos 27 anos, essa manicure de salão de beleza ainda está “pensando em ir embora” para se estabelecer “em Los Angeles”.
A imprensa do país não fala sobre esse assunto, nem faz barulho nas mídias sociais. Da mesma forma, não há estatísticas oficiais das autoridades desse regime autoritário.
No entanto, nos últimos anos, não se passa um dia sem que haja notícias de um jovem que tenha partido para os Estados Unidos, conforme observado pela AFP.
- "Chegar ao fim do mês" -
Manulo (nome fictício), 44 anos, mudou-se para Jacksonville, Flórida, há pouco mais de um ano.
“Perdi meu emprego no INSESO (Instituto Nacional de Seguridade Social) e, depois de três anos de desemprego, não conseguia pagar as contas, então vendi meu carro e solicitei um visto”, disse o pai de quatro filhos à AFP nos Estados Unidos.
Ele agora cuida de cães e envia cerca de US$ 500 (valor em 2,7 mil reais na cotação atual) para sua família todos os meses. Ele não quer revelar seu salário, mas, segundo ele, esse emprego não é nada comparado aos salários irrisórios de seu país natal: 128.000 francos CFA (valor em 1,2 mil reais na cotação atual) para o salário mínimo, de acordo com dados da Comunidade Econômica e Monetária dos Estados da África Central (CEMAC).
Com o colapso dos preços do petróleo, o principal recurso do país, a economia entrou em recessão em 2023 e o desemprego chegou a 8,5%, de acordo com o Banco Africano de Desenvolvimento.
Paciencia Mangue, formada em economia, não quer mais “perder tempo”.
“Para encontrar um bom emprego aqui, você precisa conhecer alguém no poder ou ter um parente entre aqueles que governam o país”, governado por Teodoro Obiang, de 82 anos, que está no poder desde 1979, afirma ela.
Alguns, como Manulo, conseguem um visto para ir diretamente para os EUA. Outros têm que voar para o Brasil ou Nicarágua, às vezes via Espanha, e depois entrar ilegalmente pelo México. Poucos, no entanto, saem pelo Sahel e depois atravessam o Mediterrâneo, de acordo com dados coletados pela AFP.
Entre a passagem de avião e o visto no Brasil, por exemplo - cerca de 3 mil dólares no total nesse caso (valor em 16,5 mil reais na cotação atual)- o caminho para o exílio exige um grande investimento. E depois há a parte mais difícil: chegar aos Estados Unidos, mediante pagamento.
“Sofremos”, diz Geraldina Adang, 33 anos, que partiu em janeiro de 2023 via Brasil e agora vive na Califórnia.
“Para entrar nos Estados Unidos, a morte não está longe”, diz essa mulher, que levou dois meses para chegar ao México ‘por rotas clandestinas e perigosas’ e outros três meses para cruzar a fronteira.
- "Sem esperança" -
“A falta de liberdade individual e coletiva. A falta de instituições independentes e sólidas, a corrupção sistemática, a má governança e a falta de respeito aos direitos humanos são a raiz do êxodo”, diz Joaquín Elo Ayeto, ativista de direitos humanos da ONG ‘Somos’.
O professor de sociologia Elias Mba Engonga fala de “decepção, perda de esperança em relação a mudanças políticas, políticas sociais e falta de uma distribuição justa das receitas do Estado”.
Quase seis em cada dez jovens africanos planejam deixar seus países dentro de três anos, principalmente para encontrar trabalho.
X.Rivera--LGdM